E mais uma vez a música. Sempre. A certeza do antídoto infalível contra certos estados de espírito hostis; a embriaguez saudável que comporta movimentos tradutores da alma; a apaziguadora de choros,em "seres" pequeninos ( a minha filha é o exemplo de todos os dias ).
A música que ouves condiciona-te a alma. Tal como há a companhia de certas pessoas,que pela sua carga energética (boa ou má), te absorve por completo. Pelo menos, é assim que o meu próprio mecanismo reage.
E agora...é possível não ficar muito bem disposto ao ouvir isto?
Sou anti "dias de...". Abro uma excepção para o dia de Natal,aliás,para toda a envolvência da época natalícia,do calor,dos afectos que lhe estão implícitos.E dias de aniversário,que são mesmo especiais e aos quais lhes dou um valor imenso. Mas é só.
De resto,não há calendário algum que me estipule um dia específico para celebrar o amor pelos meus pais,pelas crianças,pelo respeito pela natureza,por isto e por aquilo. E lá está,para celebrar a minha relação sentimental. Porque eu ofereço presentes quando tenho vontade de oferecer,os momentos românticos/especiais devem proliferar um pouco cada dia e além disso,o consumismo,os coraçõezinhos,o ursinho de peluche com o dizer de "I love you" escrito no seu peitinho felpudo e afins,confesso,não é para mim.
Eu sou uma mulher que não achava muita piada ao facto de, tempos atrás,no dia 14 de Fevereiro,ter recebido,por exemplo,rosas vermelhas e chocolates.Agradeci,claro,mas logo a seguir veio um "já sabes que não ligo nada a isto". Se tivesse ocorrido tal cenário em qualquer outro dia,lá está,aí o meu semblante teria sido com toda a certeza outro.
Mas no meio de toda esta "fofice" inerente ao dia,presenciei uma cena bonita. É mesmo este o adjectivo: bonita. Enquanto bebia o meu café matinal,no meu sítio do costume (devidamente apetrechado com as ementas ternurentas e adereços amorosos,mas quem tem um negócio aberto acaba por ter de ser mesmo assim), eis que surge um senhor,já com uma longa idade em cima dos ombros e depara-se com os "Love Cupcakes" (ou seja,os bolinhos cândidamente enfeitados,a transbordar mais amor,do que calorias) e pergunta à empregada: "Menina,estes bolinhos...é por causa do dia dos namorados,não é? Embrulhe-me um,que a namorada da minha vida está lá em casa e merece".
E pronto,com isto,tirou-me de imediato um sorriso da cara,porque é deste tipo de amor,que o verdadeiro amor é feito.
E já agora,como estou a falar de amor e para que não fiquem a achar-me "anti-amor" (nada disso,eu sou é anti "amor estipulado e comercial"),fica a música que me conduziu ao meu amor,mais propriamente,no dia do meu casamento (não,não foi a marcha nupcial).
E fiquem perpetuamente apaixonados(as),acima de tudo,pela vida.
Num mundo,não diria perfeito,mas amplamente melhor,apelar-se-ía à serenidade,à ponderação,à calma,ao asfixiar letal da crueldade gratuita,à amplificação de valores máximos e nobres,como o ser-se,pura e simplesmente: Bom. De bondade,dessa bondade isenta de parâmetros calculistas e interesseiros,da bondade,qual diamante em bruto,que nem por sombras seria preciso lapidar.
Violência gera violência e jamais assentar ideais na dita "se não podes vencê-los,junta-te a eles".
Não.Para mim será sempre : Senão podes vencê-"los",mostra com orgulho ao mundo inteiro o quão diferente és "deles".
E isto tudo também para dizer que este filme,vencedor do Óscar para melhor filme estrangeiro de 2011,é verdadeiramente maravilhoso.Duro,mas maravilhoso.
Por vezes questiono-me onde descobrirei eu o tempo,para fazer tudo aquilo que tenho para fazer (desde as lides quotidianas,até áquelas que aguçam o meu engenho criativo e das quais o meu "eu" subsiste),quando chegar o momento de retomar o meu trabalho e ver finda a minha licença de maternidade.
Não sei,mas o que sei inevitávelmente é que terei de ser eu,a "fazedora" do meu tempo : organizar-me de forma a que nada do que eu considere absolutamente essencial,fique adiado,posto de parte,negligenciado,ou pior,cancelado.
Julgara eu que com estes dias,teria um maior abrandamento,mas redondamente me enganei; precisamente por saber que tenho,ao acordar,uma panóplia de horas inteiramente comandadas por mim ( e pela minha filha,claro,que é a comandante-mor), procuro fazer uma imensidão de coisas e como tal,os minutos escorrem-me impiedosamente pelos dedos,por assim dizer.
Reservo a pacatez do sofá para ver um filme e a introspecção da leitura,unicamente para arrematar os meus dias,porque durante todas as outras horas que antecederam a noite (quando tudo se abranda),eu literalmente não desacelerei. Os movimentos não páram,do corpo e da mente.
A inércia não se coaduna mesmo nada comigo e ainda bem,porque este sentido "não-conformado" e "anti-inércia" que me caracteriza,colocou-me exactamente no ponto em que me encontro,hoje,na minha vida.
E lá está,a música,que é presença assídua nos meus dias.Hoje foi o dia da Billie Holiday.
Sou uma rapariga de gostos simples,entendendo-se por isto que basta um simples dia de sol, ir beber um simples café no sítio simpático do costume,descer simplesmente a avenida,ir à loja de artigos usados (a do costume) e fazer as minhas próprias delícias com objectos tão simples,quanto estes.
E o dia pautou-se por outros simples e preciosos momentos: a visita de uma amiga, o cheiro a bolo caseiro da vizinha, a gaivota que se passeava em frente à minha casa, os imensos gatos felizes que por aqui habitam e que se espreguiçam em cima dos carros e,claro, a inevitável brincadeira diária com a minha filha,já tão cúmplice,já tão atenta e o sorriso dela,a maior, a mais simples e a mais indecifrável de todas as delícias.